Confesso-vos, meus caros leitores, que já nem sei quem sou – louco ou
ambientalista. No início do despertar da minha consciência ecológica,
julgava-me um preservacionista esclarecido, um ambientalista convicto, um
cidadão orgulhoso por exercer minhas condições de cidadania. Agora, já não sei
se não passo de um louco, obcecado pela preservação do planeta e pela limpeza
da residência global onde habito.
Reconheço que, talvez, exagere quando considero o planeta a minha
residência, mas o que fazer se sinto assim? Eu não consigo ver o quintal da
minha casa ser a lixeira do mundo. Eu me rebelo por perceber que todos acham
normal jogar o lixo no chão, e esperar que o lixeiro o recolha e o despeje no
lixão.
A vontade que sinto é perguntar em que planeta fica o lixão? Será que
existe um local no universo para onde enviar o lixo e preservar a qualidade de
vida da Terra? Não, claro que não! A lixeira é aqui mesmo, logo ali na esquina,
entre a minha casa e a do vizinho. Pelo menos, é assim que todos imaginam, pois
o lixo vai sendo despejado pelo caminho.
Às vezes, eu fico pensando onde está a lógica de se comprar um tubo de
pasta de dente, colocá-la num saquinho de papel e acondicionar este saquinho
numa minúscula sacolinha plástica. Para que tantas embalagens ou por que tanto
lixo? O balconista não sabe o que responder, e nem eu o que lhe dizer.
Estou ficando cansado de repetir sempre este mesmo lenga-lenga. Outro
dia, comprei um pacote com três sabonetes sulforosos, típicos da minha cidade,
e a mocinha já ia colocá-lo num minissaquinho, quando eu agradeci, e disse que
não era preciso, pois estava com a minha mochila.
A menina me olhou espantada, e não sabia o que dizer. Eu perguntei se
ela não achava que os sabonetes já estavam bem embalados, sem que fosse
necessária uma sacola. E o que fazer com uma sacolinha daquelas? Ela respondeu
a lição decorada, informando-me que servia para colocar lixo. Eu ainda tive
paciência para perguntar que tipo de lixo, com uma sacolinha tão pequenina.
Mas, não esperei a resposta.
Qualquer dia desses, eu vou ser recolhido como louco, pois estou
sozinho na multidão. Não tão só, é verdade, minha Flora age da mesma forma, e,
assim, corre o risco de me fazer companhia na camisa de força.
Se eu digo que sou vegetariano, ouço a tradicional pergunta: mas, por
quê? E como responder a pergunta, sem ofender o ingênuo inquiridor? Cansei de
falar dos males da carne, para quem a come e para quem cria os rebanhos e mata
as pobres coitadas das vaquinhas e os boisinhos. Que mal faz matar, se o gado é
criado para isso mesmo? Esta é a resposta que se não é dita, é pensada.
Sinto vontade de perguntar a religião de quem afirma isso, mas me calo
para não arranjar uma polêmica religiosa, que costuma ser pior do que a
ambiental. Por que matar o boi pode, e matar o cãozinho de estimação, nem
pensar? Por que não é crime pegar um porco, um boi, uma galinha, e enfiar-lhes
a faca? Eles são seres vivos, que sofrem tanto quanto nós.
Os cristãos não conseguem relacionar o “não matarás” com os bichos
mortos que são assassinados para satisfazer seus prazeres à mesa. Os espíritas
leem nos livros de Ramatis, que o Mestre repete insistentemente para o seu
médium que “já tendes provas irrecusáveis de que podeis viver e gozar de ótima
saúde sem recorreres à alimentação carnívora”. Mas, como associar a religião
aos hábitos humanos, se a criatura cumpre os seus rituais religiosos como se
fossem deveres de um dia só, e que nenhuma relação têm com suas atitudes
diárias?
Sujamos as águas que saciam a nossa sede, lançando nos rios os dejetos
domésticos e os resíduos industriais. E, depois, gastamos fortunas com
equipamentos que irão despoluir mais adiante, o que poluímos aqui atrás. Parece
coisa de maluco, e é.
Derrubamos árvores para criar o gado, e transformamos florestas em
desertos. Secamos os rios, modificamos as estações das chuvas com agressões à
natureza e, depois, perdemos toda a safra agrícola por conta dos crimes
ambientais.
A tradição celebra a cada ano a queima dos pastos para trazer a relva
verde para o gado. Ao final de três a cinco anos, a terra já não faz renascer o
capim, por conta da perda dos nutrientes, a cada ritual das queimadas. E
ninguém muda seus hábitos, nem as autoridades tomam medidas de proteção às
matas.
E ainda temos de aturar as incoerentes afirmativas de que não está
havendo variações climáticas provocadas pelos homens. A desgraça que estamos
enfrentando em todas as partes do mundo deve ser levada à conta dos ciclos
porque passa a Terra de tempos em tempos. E, diante disso, mais predadores
destroem os recursos que seriam renováveis, se eles deixassem seguir o fluxo
natural.
Discute-se se a temperatura do planeta está mais fria ou mais quente,
enquanto se agride de todas as formas os recursos naturais, sem levar em conta
que a resposta está nos atos em si, de agressão a esses recursos, como se eles fossem
ilimitados.
As condições de vida estão piorando, apesar de toda a tecnologia
disponível. A pobreza aumenta no mundo, a fome avança por regiões antes prósperas
e autossuficientes nas plantações de alimentos básicos. A água potável está
desaparecendo em diversas regiões, sendo cobrada e bem cobrada, em locais onde
só os mais ricos podem pagar por uma garrafinha de água.
Tudo isso acontece diante dos olhos de uma civilização seduzida e
hipnotizada pela ganância e pelo consumismo. Todos se vendem por umas miçangas
ou turmalinas. A vida não se compra, pois não há dinheiro que a pague. Dinheiro
não mata sede, pois chegará o dia em que, com o dinheiro na mão, o cidadão
morrerá de sede.
Será que estou ficando louco, meu atento leitor? Preocupar-me com o
excesso de sacolinhas, com embalagens em excesso, com lançamentos de tecnologia
de ponta a cada ano. O lixão aumentando e as doenças acompanhando seu
crescimento. O que está acontecendo com a raça humana?
O ser humano está perdendo a sua noção de solidariedade, e toma para si
o que precisava ser dividido. Derrubar florestas dá emprego, então abaixo as
árvores. Currais e granjas geram renda e matam a fome, nem importa com que consequências
maléficas. O que conta mesmo é o dinheiro no bolso e a barriga cheia.
Eu estou me dirigindo a ti, meu inocente leitor, ou que te julgas como
tal, que segues o maligno progresso que coloca o dinheiro na frente, e o resto
vem depois. Tu és cúmplice dos responsáveis pela destruição da natureza, se
consomes a política exploradora que toma conta do mundo.
Encerro por aqui esta minha dolorosa reflexão, antes que eu mesmo me
tranque no hospício, vendo tantos celebrarem a desgraça da raça, enquanto eu
esbravejo contra o que dá prazer e riqueza a essas hienas modernas.
Sou um louco, ou apenas um simples ambientalista? E tu, meu calado leitor, entras no hospício
comigo ou permaneces do lado de fora, testemunhando a minha loucura? Afinal,
precisas decidir se tu és um consciente consumidor, um inveterado consumista ou
um pobre consumido. Enquanto decides, eu sigo com as minhas loucuras, mais
saudáveis que as ações insanas desses que se julgam lúcidos e coerentes.